sexta-feira, 6 de junho de 2014

Almeida Garret - crônica

por António Nametil Mogovolas de Muatua (António Matabele) - Moçambique

... os frutos da educação são demorados, mas perenes na vida de um País! Invistamos, então, sem receios, nesta indústria de transformação do Homem!

 Almeida Garret,
 Os meus amigos – principalmente os mais jovens – dirão, com cargas de razão: “este velhote pirou de vez, coitado já nos deixou! A que propósito é que agora vai nos falar de Almeida Garrett?”.

Os que assim me sentenciassem teriam razão se a arte tivesse fronteiras, idade, não fosse ela perene e de validade internacional.

O nome da pessoa que dá título a esta reflexão foi um grande dramaturgo português, no período em que as artes e os saberes daquele povo da Península Ibérica fizeram luz neste mundo sempre tendencialmente cada vez mais globalizado.

De seu nome completo, João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett, foi um escritor e dramaturgo romântico, orador, par do reino, ministro e secretário de estado honorário, nasceu a 4 de Fevereiro de 1799 e faleceu a 9 de Dezembro de 1854.

        Mas não me refiro ao Almeida Garrett homem. Falarei, com muita nostalgia, do Cine Teatro existente (?) em Nampula e que tinha (tem?) o seu nome.

        Esta coisa de as vicissitudes da vida nos levarem para longe da terra aonde nosso umbigo está enterrado, obriga-nos a padecermos de saudades incuráveis das pessoas, dos odores, dos sabores, das coisas que testemunharam a nossa infância, criancice, meninice e adolescência. Era esta nostalgia levada ao extremo, ao paroxismo do insuportável, que levava os escravos a morrerem de uma doença catalogada nos dicionários do Brasil – país maior recipiente de escravos naquele tempo – de banzo. Morriam de banzo porque apesar de o escravo ser fisicamente possante era, segundo a segundo, consumido e corroído por grande saudade da sua terra natal da qual fora arrancado abrupta e violentamente.

        De banzo não padeço, mas sinto grande falta das gentes e do ambiente nampulense no qual eu me auto-construi.

        Desde os concursos de música promovidos pelo Padre Agostinho Rodrigues, durante os quais, aos Domingos, cantadores anónimos da nossa meninice se enchiam de coragem e ao palco subiam para mostrarem os seus dotes adormecidos de cançonetistas.

Falo também das peças de teatro preparadas à pressa lá no bairro e que íamos apresentá-las ao Domingo no Almeida Garrett, depois das 10,00 horas e que terminavam, impreterivelmente, antes das catorze, porque o dono da sala – que nos emprestava a custo zero – precisaria dela para passar os seus filmes da matiné das 17,30 horas, para maiores de 12 anos de idade.

        Naquela sala, sempre cheia, nas matinés aos Domingos à tarde, aprendemos a saber apreciar a chamada sétima arte, vendo desde filmes de grande qualidade até os medíocres do tipo “sete contra o mundo” e “gringo não perdoa”, “cada bala tem um nome”.

        E como não me recordar do Rijo, jogador de futebol do Benfica de Nampula, que era zeloso porteiro e arrumador da sala de cinema, que fingia não se aperceber que em algumas cadeiras os pequenos espectadores se sentavam aos pares, porquanto por serem namorados achavam que aquele era o melhor momento para trocarem algumas intimidades na escuridão da exibição dos filmes.

        Mas relembrar Almeida Garrett é lançar um brado de socorro, pedindo aos gestores de cúpula das actividades culturais, lúdicas e de carácter artístico em Moçambique, para que, em conjunto, revejamos os actuais paradigmas de educarmos os nossos filhos para saberem amar a beleza destas manifestações que alegram o espírito do Homem.

        Com efeito, neste mundo sempre globalizado, depois de bem e muito trabalhar para desenvolver o País, o Homem moçambicano precisa de se divertir lendo bom livro, vendo bom cinema, assistindo bom teatro, dançando ao som de boa e alegre música, apreciando arte de qualidade, enfim, encontrando ambientes edificantes para se descontrair e retemperar energias para novas jornadas de trabalho.

        Que os muitos espaços Almeida Garrett espalhados pelo País voltem a exercer a sua função essencial para a felicidade do Homem do nosso País. 

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João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett e mais tarde 1.º Visconde de Almeida Garrett, (Porto, 4 de fevereiro de 1799 — Lisboa, 9 de dezembro de 1854) foi um escritor e dramaturgo romântico, orador, par do reino, ministro e secretário de estado honorário português. Grande impulsionador do teatro em Portugal, uma das maiores figuras do romantismo português, foi ele quem propôs a edificação do Teatro Nacional de D. Maria II e a criação do Conservatório de Arte Dramática.

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Pesquisa visual e postagem por Oubí Inaê Kibuko, para Cineclube Afro Sembene e Fórum África. 

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